Diretores, remendos e bônus

Ser Diretor está perdendo o glamour – pelo menos no noticiário. Nos Estados Unidos, diretores de empresas que foram socorridas pelo governo estão tendo de devolver seus bônus milionários. Outros perderam emprego, e alguns, a pose. Pobres, não… não. Já no Brasil, o excesso de diretores na estrutura administrativa das casas legislativas está espantando o público. Em Brasília, havia 2,4 Diretores por Senador. Em São Paulo, há 2 Diretores por cada 3 Deputados estaduais. Tenho certeza que isso se repete pelo Brasil a fora.

O motivo imediato é simples: falta de transparência de como os recursos públicos são gastos, bem como falta de cobrança sistemática por tal nível de transparência. Não é prática comum, em nosso país, o Poder Legislativo prestar contas com um razoável nível de detalhe à sociedade. O próprio presidente do Senado se embaralha com o número de diretores sobre seu – na verdade, nosso – teto. No dia 18 de Março, disse haver 131. Mudou para 136 e, depois de 2 dias, corrigiu para 181. Como não se presta contas dos detalhes, não faz muito sentido também saber sobre os detalhes, pois restringem-se às caixas escuras da política burocrática. Nada me admira saber que Sarney anunciou que irá reduzir apenas 50 diretores, restando apenas 131 – coincidentemente, o número que apresentou primeiro. Mesmo assumindo que o Presidente do Senado esteja correto, por que é necessário 1,6 diretor para cada Senador na Casa?

Um segundo motivo, que está dado, é o alto poder de barganha que o Poder Legislativo tem, por natureza, frente o Executivo durante o processo orçamentário. Dificilmente, o Executivo nega recursos para o Legislativo, sobretudo para cobrir gastos de pessoal. Até porque, é o Legislativo que aprova o orçamento final, preparado pelo Executivo. Como em termos globais, os gastos do Legislativo são pequenos, releva-se. Aparentemente, o Tribunal de Contas, órgão oficialmente vinculado ao Legislativo, mas praticamente independente de fato, também não fiscaliza bem as contas da Casa.

Por fim, e mais importante, o excesso de diretores é apenas um sintoma de um problema que perpassa a estrutura administrativa do Estado Brasileiro nos diferentes níveis de governo: o desalinhamento e defasagem organizacional e administrativa dessas organizações. O cargo de diretor nessas organizações públicas existe em excesso não por causa de seu poder ou função de fato (como a dos executivos do setor privado norte-americano que citei acima), mas como forma de dar um "bônus" ou promoção salarial (em torno de 2 mil reais no Senado e mais de 6 mil na Assembléia paulista) aos funcionários da Casa.

Ao invés de revisar e atualizar a legislação, mudar a estrutura de cargos e funções, colocar em pauta a produtividade e o desempenho dos servidores públicos, optamos por remendos. Esses remendos fazem da realidade organizacional dos órgãos públicos uma aberração perante a estrutura administrativa  prevista na arcaica legislação. Algumas práticas podem estar em conformidade com a lei,  porém desrespeitam completamente preceitos básicos de boas práticas de gestão. Contratos, a princípio, em não conformidade com a lei são realizados para que órgãos públicos funcionem. O Ministério Público, por sua vezes, contesta, negocia, remenda. O governo ajeita, remenda. Até formarmos uma colcha, nenhuma reforma sistêmica e condizente com nossos tempos e desafios de futuro vem.

Há políticos que, sabendo do longo prazo e da natureza dessas reformas, desistem. Não é a minoria. Sabem também que esse tipo de reforma iria gerar insatisfação por parte da burocracia, acomodada nas benesses existentes. Os Sindicatos, incrivelmente conservadores, seriam os primeiros a levantar a mão para expressar o viés e a ignorância que lhes são peculiar. Reformas sempre têm um custo, que precisam ser avaliados, assim como seus possíveis benefícios de longo prazo. Ainda assim, é preciso decisão, estratégia, cronograma, implementação, monitoramento e resultado - como no mundo real, em que se exige qualidade pelo que se paga.

Toda pessoa que conhece minimamente setor público sabe disso. Porém, quando uma notícia desta vaza para a imprensa (o que deveria estar no website do Legislativo), as decisões nunca enfocam o problema maior, a causa, pois não está na mídia. Portanto, o jeito é cortar 50 vagas de diretores e voltar ao dia-a-dia da vida dos remendos… até uma nova reportagem.

Pelo menos uma coisa temos certeza, são dias de menos "bônus" para diretores – seja lá de que espécie forem.

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