Acordamos com a sensação de dever cumprido e com a dúvida do nosso próximo passo. Sentidos pelos olhos-roxos, mas orgulhos do país e nosso povo. Como fazer com que a voz das ruas, as demandas coletivas e apartidárias por um Brasil melhor, se traduza em uma nova realidade política?
Primeiro, pedimos mudanças claras nos valores e práticas na política. É um passo dado. Honestidade de governantes e gestores públicos, a mediação pacífica na resolução de conflitos (pelo menos, pela maioria dos manifestantes), prioridade da ação pública no que realmente importa para nosso desenvolvimento (saúde, educação, proteção aos direitos, infraestrutura), transparência e qualidade do investimento público. Basicamente, é um grito de que queremos fazer as coisas certas do modo certo.
O segundo passo será mais complexo: como trazer o movimento das ruas para os partidos políticos. Vivemos em uma democracia representativa e, invariavelmente, toda mudança política precisa passar pelas urnas, por intermédio dos partidos. Os partidos políticos no Brasil são sistemas fechados pouco inclusivos e dominados por seus velhos caciques. Não por acaso, têm sido incapazes de assimilar e canalizar as demandas populares, como também acomodar efetivamente a juventude em suas estruturas. Caso tivessem, será que haveria manifestações nesta proporção? No mínimo, a probabilidade diminuiria. As perguntas que ficam no ar são: os partidos irão responder ao clamor das ruas e fomentar a participação inclusiva em sua estrutura de governança? Fomentarão a inovação de seus quadros de maneira democrática? Ou, o movimento ainda disperso e heterogêneo tentará formar um novo partido?
Tudo ainda está no ar. Os políticos e os partidos estão calados. Algumas lideranças pronunciaram-se ontem, sem dizer muito. Outros, menos atentos, diferiram palavras de ordem no final da semana passada. Mas não há partido algum que transmitiu uma mensagem coesa. É um bom sinal: o povo tirou a classe política da inércia e sinalizou que quer algo diferente. Quem iniciará o movimento de aproximação entre a rua e os partidos? Se não houver, a manifestação acabará como uma quarta-feira de cinzas ou em 31 de março?
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