Os manifestantes ainda estão nas ruas. Os governantes, nos castelos. Para que ambos não percam legitimidade, cada uma da sua maneira, talvez tenham que separar o movimento em dois: o pacífico e o violento.
Se os 20 centavos foi “a gota d’água”, a insatisfação das pessoas com a falta de participação política, má qualidade das políticas e serviços públicos e a violência covarde da polícia na semana passada foi o que fez as ruas do Brasil serem ocupadas por uma massa – heterogênea, mas esperançosa – de pessoas.
A reação violenta e literalmente incendiária de alguns manifestantes ontem a noite na Prefeitura de São Paulo coloca outra pergunta na mesa: quando é que haverá uma cisão (clara) nesse movimento entre os que acreditam em meios pacíficos e os que creem na legitimidade da violência como meio de busca do poder ou mudança política? Não tenho dúvida que a maior parte das pessoas optaria por ficar no primeiro grupo. São aquelas que concordam, em princípio, com o estado de direito e que clamam decência da classe política. Ao mesmo tempo, recusam-se a fazer eco na corrente violenta das manifestações. Será preciso, então, diferenciar os movimentos para que o esforço de mobilização não se perca na fumaça. Ainda assim não fica claro como se organizarão ou estão se organizando.
Se os governantes parecem perdidos, é melhor focarem em resolver o problema. Reduzir 20 centavos da passagem de ônibus poderá acalmar os ânimos, mas não adiantará no médio prazo. É preciso mudança na atitude, na estratégia e na comunicação dos governantes e dos partidos, bem como na forma de pensar política pública no Brasil. Mais inclusão, mais transparência e alocação de orçamento mais progressiva. Claro, menos oportunismo. Ao mesmo tempo, o que povo não quer é uma situação anárquica. Para isso, os governos precisam deixar de lado sua consciência de culpa pela brutalidade da quinta-feira-de-borracha e agir estrategicamente, de modo profissional e respeitando os princípios da cidadania, para deter aqueles que depredam o bem público e escolhem a violência como forma de protesto. Há tecnologias e inteligência para esse tipo de ação policial. Há leis para serem cumpridas. Basta usá-las. Aliás, por que já não estão sendo usadas?
Enquanto a brasa ainda está quente, o Congresso passa o projeto de lei conhecido como “cura gay”. Motivo é que não falta para continuarmos protestando – sem violência, sem golpismo, mas com convicção. Como podem notar, já tomei minha posição do lado dos pacíficos.
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